A chegada dos colonizadores portugueses às terras brasileiras, em 1500, foi marcada pela violência, exploração, apagamento e massacre das memórias e crenças dos povos que já habitavam o “novo mundo”. As influências desses acontecimentos se mantêm profundamente enraizadas em nosso cotidiano. A língua que falamos, nossa mestiçagem e as religiões cristãs, que somam a maioria de fiéis espalhados entre as cinco regiões do país, são alguns exemplos dessa influência.
Nesse cenário, não podemos deixar de citar a interferência portuguesa à formação literária brasileira, afinal, não foram somente espelhos e escravidão que vieram nos navios exploradores. As cartas de Pero Vaz de Caminha (1450-1500) abriram as portas para o Quinhentismo, período também conhecido pelo termo “literatura de informação”, que representa as primeiras produções literárias no Brasil. Já no século XVII, o destaque vai para o padre Antônio Vieira (1608-1697), um dos principais autores do Barroco em ambas as nações.
Nascido em 6 de fevereiro de 1608, padre Antônio Vieira mudou-se para o Brasil com apenas seis anos de idade, ao lado da família, após seu pai ter sido designado ao cargo de escrivão, na capital baiana. Foi missionário, teólogo e diplomata, se tornou um dos mais importantes portugueses oradores de sua época. Iniciou a carreira de pregador em 1633, tendo ingressado na Companhia de Jesus, dez anos antes.
Ao lado de Bento Teixeira (1561-1618), Gregório de Matos (1636-1696) e Frei Manuel de Santa Maria de Itaparica (1704-1768), o padre Antônio Vieira, como supracitado, foi um dos principais autores do Barroco brasileiro, tendo os seus sermões, o intuito de atrair novos fiéis ao catolicismo, incluindo a catequização dos povos indígenas, de extrema relevância para o período. Dentre alguns dos mais conhecidos estão o Sermão de Santo Antônio e o Sermão da Sexagésima, ambos com temática religiosa, aplicando tanto o conceptismo quanto o cultismo, com trechos que empregam o jogo de palavras e ideias que fazem parte das metáforas paradoxais características das obras do Barroco. O Sermão da Sexagésima foi escrito em prosa em 1655 e encontra-se dividido em dez partes, tem temática direcionada à religiosidade, bem como à própria forma de fazer sermão.
“Fazer pouco fruto a palavra de Deus no Mundo, pode proceder de um de três princípios: ou da parte do pregador, ou da parte do ouvinte, ou da parte de Deus. Para uma alma se converter por meio de um sermão, há-de haver três concursos: há-de concorrer o pregador com a doutrina, persuadindo; há-de concorrer o ouvinte com o entendimento, percebendo; há-de concorrer Deus com a graça, alumiando” (Sermão da Sexagésima, 1655).
Quando retornou a Portugal, em 1641, padre Antônio Vieira tornou-se o maior pregador do reino de D. João IV, nomeado o “Pregador Régio” pelo monarca, de quem veio a se tornar conselheiro, e passou a participar ativamente de questões políticas, representando a corte em relações com outros países. Por defender os indígenas e se posicionar contra a escravidão, foi expulso da Companhia de Jesus e atraiu o ódio da inquisição, que o perseguiu e o prendeu, em 1665, acusado de heresia e anistiado em 1668.
Padre Antônio Vieira, chamado de “Paiaçú” (“Grande Pai”) entre os índios, considerado pelo poeta Fernando Pessoa (1888-1935) o “Imperador da Língua Portuguesa”, morreu em 17 de junho de 1697, em Salvador, deixando mais de 200 sermões, que ele organizou para publicação antes de morrer.
Sobre a autora:
Shirley Pinheiro
Graduanda em Letras pela Universidade Regional do Cariri.