Para uns, parnasiano pela opção pelo soneto; para outros, simbolista pela atitude místico-filosófica; naturalista pela linguagem determinista e cientificista; para muitos, moderno pela multiplicidade de tais características, aparentemente incompatíveis. Simplesmente poeta, eis Augusto dos Anjos, “aquele que ficou sozinho”, “Doutor Tristeza” nascido no dia 20 de abril, de 1884, no estado da Paraíba.
Todo grande escritor é, antes de tudo, um leitor. Com Spencer aprendeu a incapacidade de se conhecer a essência das coisas, com Schopenhauer refletiu sobre o aniquilamento da vontade própria como forma de sobrevivência e sobre uma impossibilidade da felicidade. Com a Bíblia foi capaz de contestar o cristianismo e a religião de modo geral. Dessa forma, sua Poética exala uma eterna dor de existir.
Em 1912, publica seu único livro Eu, formado por cinquenta e seis poemas, dos quais quarenta são sonetos decassílabos. “Que ninguém doma um coração de poeta”, sobretudo se sua Poética explora questões tétricas, como “cloaca”, “escárnio”, “verme”, etc. Mesclando termos poéticos com termos filosóficos e com um vocabulário científico, Augusto dos Anjos construiu uma obra pulsional, violenta, melancólica, visceral e pessimista.
Interessante notar que quando Eu foi publicado, não foi bem recebida pelo público leitor, bem como pela crítica especializada que não conseguia se desprender do Parnasianismo, assim como não concebia que poesia pudesse ser construída valendo-se de expressões como: “o sangue podre das carnificinas” (Poesia Psicologia de um vencido) e “O beijo, amigo, é a véspera do escarro” (Poema Versos Íntimos). Como bem assinalou um dos muitos leitores desse livro singular, Manuel Bandeira, não se trata de um fenômeno excêntrico e, sim, de uma obra que “foi incorporada definitivamente ao panorama de nossa literatura”.
Bandeira não é o único a achar obra augustiana sui generis. E declarou: “li o EU na adolescência, e foi como se levasse um soco na cara”. Depois do susto, um sentimento de curiosidade: “Quis ler mais esse poeta diferente dos clássicos, dos românticos, dos parnasianos, dos simbolistas, de todos os poetas que eu conhecia”. Assim como o poeta Drummond, meu primeiro sentimento ao ler Augusto foi descobrir nele um “Anjo(s)” nascido sob o signo da torção para ser gauche na vida.
Sua linguagem é orgânica, agressiva, capaz de despir os desejos, as angústias e a dor de existir do outro. A dimensão cósmica, a angústia moral, a melancolia e o pessimismo permeiam os versos augustianos que, formalmente, apresentam um vocabulário rebuscado, figuras de linguagem, jogos de palavras e rimas ricas e incomuns.
Que ninguém doma um coração de poeta! Por isso, a grande contribuição Augusto dos Anjos é utilização de termos “a-poéticos” e do não compromisso com o “Belo”. A filosofia e a ciência ajudam, pois, esse poeta a esculpir um “eu” hermético, profundo, fechado em si mesmo e uma poesia de forte carga expressiva que transborda elementos transgressores.
Sobre a autora:
Luciana Bessa Silva
Idealizadora do Blog Literário Nordestinados a Ler