O Município do Crato (CE), em 2022, gastou do orçamento municipal 0,67%, cerca de 85% deste percentual foi gasto com folha de pagamento e encargos sociais, menos de 15% foi destinado para fomento e outras despesas da pasta. Nos últimos sete anos, o investimento no setor cultural não chegou a 1%. O resultado destes números tem incidência direta no processo de sucateamento dos equipamentos culturais e na política de fomento artístico-cultural.
O Crato, cidade conhecida como “capital da cultura”, conceito elitista, inadequado e excludente demonstra contradições e equívocos. Atualmente, o conjunto dos equipamentos culturais do Município estão fechados ou apresentam condições inadequadas para uso: Museu Histórico e de Artes Vicente Leite, Teatro Salviano Arraes, Centro Cultural do Araripe, Estação da Cidadania, Caldeirão da Santa Cruz do Deserto, Biblioteca Central e Luiz Cruz e anfiteatro da Praça do Cruzeiro. A ausência de espaços em condições de funcionamento contribui para dificultar a democratização estética, artística, literária e cultural da mesma forma que a redução dos investimentos em fomento prejudica a cadeia econômica da cultura e a fruição estética.
Os percentuais investidos no setor cultural do Crato demonstram que são insuficientes pela dimensão populacional do Município, que atualmente tem mais 133 mil habitantes, e está situado numa região efervescente de pluralidade e diversidade cultural, marcada pela convivência, contraste e hibridismo do popular e do erudito, dos terreiros e das academias, da dança clássica e do reisado, do cordel e das teses acadêmicas, dos arranha-céus e da Chapada do Araripe. Essa complexidade de elementos exige maior investimento. Se pegarmos como recorte a população e dividirmos pelo valor gasto em 2022 (R$ $2.939.338,61), teríamos um investimento menor do que R$ 2,00 por habitante/mês. Lógico que essa matemática não dá conta da dimensão simbólica na vida da população, mas, pode instigar o processo de reflexão sobre aquecimento e desaquecimento na economia da cultura, no sentido de aprofundar o debate sobre as condições de sobrevivência das trabalhadoras e trabalhadores da cultura.
Desde 2012, o movimento cultural defende a destinação de 2% do orçamento para a cultura. Neste mesmo período, o movimento já defendia a criação do Sistema Municipal de Cultura e a implementação do Cultura Viva Municipal. O Sistema foi criado em 2014 e a Lei Cultura Viva (Pontos de Cultura) em 2021. Dois marcos legais dos segmentos culturais capazes de estruturar a política pública para a cultura no Município, entretanto, o arcabouço jurídico ainda não encontrou as condições políticas e econômicas favoráveis para impulsionar a democratização da política cultural.
A grande questão é criar políticas de estado para cultura, visando evitar que elas sejam demolidas no trânsito dos governos.
A pauta dos 2% tomou conta do debate na última Conferência Municipal de Cultural que teve como tema “Uma Política Pública para o Crato: Implementação do Plano Municipal de Cultura”, que aconteceu nos dias 24 e 25 de março e deverá elaborar o documento referência para a cultura do Município para os próximos 10 anos. A conferência aprovou duas propostas relativas aos 2%: a primeira é a inclusão dos 2% na Lei de Diretrizes Orçamentárias – LDO para ser implementada em 2024 e a outra é a elaboração de Lei que cria a destinação de percentual de 2% do orçamento para a cultura, sendo 50% para o fomento artístico-cultural.
A luta pelos 2% do orçamento para a cultura representa uma estratégia para colocar o Plano Municipal de Cultura dentro do orçamento do Município e ao mesmo tempo ir consolidando o Sistema Municipal de Cultural. Os 2% é uma trincheira de luta para o promover o desenvolvimento econômico, social, territorial, o direito à cidade e a cidadania cultural.
Sobre o autor:
Alexandre Lucas
Alexandre Lucas é escrevedor, articulista e editor do Portal Vermelho no Ceará, pedagogo, artista/educador, militante do Coletivo Camaradas e a integrante da Comissão Cearense do Cultura Viva.