Ativista dos movimentos de valorização da cultura negra, Conceição Evaristo, mineira, nascida no dia 29 de novembro de 1946, é uma escritora multifacetada, que estreou como romancista com a obra Ponciá Vicêncio (2003), foi agraciada com o Prêmio Jabuti com os contos de Olhos D’água (2014) e se encontrou nos versos com Poemas de Recordação e Outros Movimentos (2017).
Mãe lavadeira (Josefina Evaristo), tia lavadeira (Maria Filomena da Silva), desde muito cedo, Conceição Evaristo aprendeu a cuidar do corpo e da casa dos outros para sobreviver em meio a uma sociedade que não foi concebida para mulheres, tampouco, as negras.
Aos setes anos de idade foi morar com a tia Filomena e o tio Totó para que a mãe tivesse uma boca a menos para sustentar. A privação do convívio materno, ausência do pai, foi dirimida pela presença do padrasto, por isso, Conceição gosta de verbalizar: “Dele sei o nome todo. Aníbal Vitorino e a profissão, pedreiro”, não foram impeditivos que ela pudesse estudar: Graduou-se em Letras pela Universidade Federal do Rio de Janeiro, tornou-se Mestre em Literatura Brasileira pela PUC do Rio de Janeiro (1996) e Doutora em Literatura Comparada na Universidade Federal Fluminense (2011).
Leitora de Carolina Maria de Jesus, que na década de 1960 publicou Quarto de despejo: diário de uma ex-favelada, Conceição Evaristo confessa que ao ler essa obra, sentiu-se uma personagem caroliniana, já que remexer nos restos dos ricos foi um processo vivenciado por sua família.
Estudante de escola pública, foi nesse ambiente que Evaristo tomou consciência de sua condição de mulher negra e pobre, além de experimentar um “apartaid” escolar, já que o espaço das aulas era uma construção de dois andares: no andar superior, estudavam os alunos mais adiantados; no inferior, ela e os irmãos. Foi ainda na escola, no final do primário (1958), que Conceição ganhou o seu primeiro prêmio de literatura, com a redação: “Por que me orgulho de ser brasileira”. Esse foi o primeiro de muitos: em 2017, a autora foi tema da Ocupação do Itaú Cultural de São Paulo. Em 2019, foi a homenageada da Bienal do Livro de Contagem. E, mais recentemente, em 2023, recebeu o Troféu do Prêmio Juca Pato de Intelectual, em virtude de sua contribuição à literatura brasileira por suscitar temas fortes – ancestralidade, maternagem, violência contra a mulher, realidade e valorização da cultura afro-brasileira – em suas obras. A mais recente, 2022, Canção para Ninar Menino Grande, discute-se a “complexidades em torno da masculinidade de homens negros e os efeitos nas relações com as mulheres negras”.
Aos 73 anos de idade, Conceição Evaristo fez a travessia de Belo Horizonte para o Rio de Janeiro em busca de melhores perspectivas. Nesse percurso, sempre foi perseguida pela literatura, já que nasceu rodeada de livros e, através deles, aprendeu a colher palavras. Sua casa podia não ter bens materiais, mas tinha algo mais preciso: a união familiar e a contação de histórias: “Tudo era narrado, tudo era motivo de prosa-poesia”, afirma Evaristo em suas entrevistas.
De tanto escutar histórias, a autora de Becos de Memória (2006), decidiu contar as suas próprias, mas que poderiam ser de outras mulheres. Daí nasceu o conceito da escrevivência (escrever +vivência), um convite a conhecer e refletir sobre a condição da mulher negra em uma sociedade patriarcalista, racista e preconceituosa.
Conceição Evaristo é um dos nomes emblemáticos da literatura brasileira contemporânea, que fortalece o sentimento de negritude ao não estereotipar e não endeusar o negro, mas tratá-lo de forma generosa, mostrando suas potencialidades e suas fragilidades.
Sobre a autora:
Luciana Bessa Silva
Idealizadora do Blog Literário Nordestinados a Ler