Gilles Diniz
Revolución
(um fato histórico)
A fibra de algodão que subia o São Francisco chegou ao Sena e ao Tâmisa para transformar-se em tecido de luxo. Dom João VI sonhava com um império americano no Reino do Brasil e, embora esteja oficialmente escrito que a independência ocorreu em 1822, os ventos quentes da revolução já redemoinhavam pelas terras pernambucanas desde 1817.
en la plaza
No centro de Crato, há apenas uma rua com nome de mulher. Cercada e cruzada por ruas com nomes de reis, duques, coronéis, médicos, padres e políticos. Curiosamente, nesta rua, há uma esquina com um poste da década de 50. Saudosismo ou esquecimento, ele ainda está lá.
en la casa
À sombra da timbaúba, erguida do chão de poeira, ao longe uma miragem, um joaseiro, não sei quantas chuvas, quantas visitas, quantos abraços, quantos passos pela soleira, também pelas janelas vi o gado, a cana, o algodão a passar, tantos almoços fartos, tardes mornas cantadas de assum preto, livros e ideais, jantares silentes seguidos de histórias de assombração e o assombro do fogo a crescer pelos alisários, refulgindo sobre as telhas de barro, e nem um só vento moveu minha pedra angular.
y en la cama
(retrato de uma mulher imaginária)
No rio Paraguaçu, que deságua na Baía de Todos os Santos, cerca de dez mil pessoas se reuniram para um embate contra a coroa portuguesa. No batalhão, estava Maria Quitéria disfarçada de soldado da infantaria. Maria Quitéria foi uma marisqueira e pescadora, tinha os braços tostados de sol. Mais ardida é a folha da cansanção.
Gilles Diniz
Gilles Diniz – é escritor, ilustrador e compositor. É autor dos livros Nas Águas do Tempo (2021), O Pequeno Livro dos Mortos de Nia (2022). É coeditor da revista Intermitências e da Corte Seco.