Amigos velejadores
Travessia do Atlântico a vela: sem hora para sair, sem dia para chegar (2024) é um projeto coletivo de três amigos, os cearenses – Augusto César e Miguel Sávio e o paulista Beto Peixoto – que se reuniram em uma embarcação a vela saindo de Salvador até chegar na marina de horta na Ilha de Faial no arquipélago de Açores -Portugal. Eles vão nos contar a relação deles com o mar, momentos da viagem, idealização e lançamento do livro.
Augusto (“Indiana Jones dos mares cearenses”) – Você foi o responsável por ligar para o Miguel e o Beto para convidá-los para essa jornada saindo de Salvador passando em barra do São Miguel e indo a marina de Horta na Ilha de Faial no arquipélago dos Açores – Portugal. A ideia de registrar toda essa aventura no livro, partiu de quem? E as belíssimas fotos? Como foi todo esse processo, já que cada um tinha seu próprio diário de bordo?
Não saberei dizer exatamente de quem partiu. Eu já tinha um diário de outra travessia e também produzo livros e documentários. Acho que foi um desejo de todos. Com relação às fotos, basicamente são minhas e do Beto, o Miguel perdeu o celular no início da viagem. Mantivemos na íntegra com pequenos ajustes no aspecto técnico e foram compiladas pelo Miguel.
Beto (“Audacioso velejador”) – O que foi mais fácil para você: a travessia em alto mar, ou a compilação e organização todo o material para a composição do livro? E o mais desafiador: a convivência com os outros tripulantes, ou ficar desconectado com os que ficaram em terra firme?
A travessia em si foi o mais fácil, soube vislumbrar cada momento, aproveitar, conhecer, respeitar o mar. A organização e a composição do livro foi algo muito natural, também prazeroso, revisitamos e revivemos a viagem nessa construção. E sem dúvida nenhuma a convivência a bordo foi o mais desafiador. Ficar desconectado na verdade foi um presente, tão importante para a vida nos dias de hoje esse momento, me fez bem e feliz. Já a convivência “confinada” tem seus conflitos.
Miguel (“O Lobo do Mar”) – Como se deu sua relação com o mar e com as embarcações, já que você tem um livro chamado Velas do Ceará – embarcações artesanais do litoral?
Eu tenho uma boa história com o mar. Minha formação inicial é de oficial de náutica da marinha mercante. Viajei no exterior e no Brasil por muito tempo mais a trabalho e em navios mercantes a motor. Em embarcação a vela numa rota como fizemos foi a minha primeira vez, pois as minhas viagens anteriores em veleiros eram pelo litoral brasileiro. Então a relação com o mar era de encanto e descobertas pois num veleiro você sente o mar muito próximo, está do seu ladinho mesmo, pois a embarcação por mais segura que seja é pequena na superioridade do mar. No livro Velas do Ceará – embarcações artesanais do litoral, falo das nossas embarcações pesqueiras e na pesquisa, tive muita interação com os mestres destas embarcações, inclusive navegando com eles em viagens de pesca. Daí veio o meu desejo de velejar. Passei então a me dedicar nesta atividade que tem me dado muito prazer e alegria.
Augusto (“Indiana Jones dos mares cearenses”) – O livro foi lançado recentemente, dia 17 de julho, no Iate Clube de Fortaleza. Como foi para você ver tanta gente reunida para conhecer esse projeto que começou com uma ligação sua para os amigos Beto e Sávio?
Foi surpreendente ver tanta gente nos prestigiando, e também o clima descontraído do evento. Sinceramente não esperava tanta repercussão.
Beto (“Audacioso velejador”) – Quando o livro ficou pronto e chegou em suas mãos, qual foi a primeira sensação que você teve ao folhear as páginas? Tem alguma história que ficou fora do livro e que você gostaria de acrescentar?
Pegar o livro foi uma grande satisfação, abri um sorriso, foi muito bom. Me fez sentir orgulhoso da viagem e do processo de publicação. Ficaram muitas histórias de fora sim, a ideia inicial era fazermos textos temáticos sobre os eventos climáticos, a arte de velejar, os dessabores da partida e do querer chegar, mas entendemos que o diário de bordo agregaria muito valor também, e resolvemos deixar só o que escrevemos durante a viagem, registrando o calor e os sentimentos do momento.
Miguel (“O Lobo do Mar”) – Além de ficar incomodado com as manias e “toques” do comandante, quais foram suas maiores dificuldades nessa travessia Brasil-Portugal? Se pudesse repetir essa jornada, o que faria diferente?
A convivência em ambientes confinados e de muita proximidade devido à necessidade de realização de tarefas conjuntas com pessoas diferentes em estilos de vida sempre é e será um grande desafio. E no catamarã My Way não foi diferente. A minha experiência ajudou muito no trato pessoal e vivência a bordo que apesar de alguns desconfortos se deu de forma muito boa. Um principal ponto que destacava era que o My Way era a casa do comandante, que era seu proprietário pois morava nele. Assim tinha suas manias e exigências peculiares a isto. O que faria diferente? Hummm, deixa ver, acho que eu curtira mais a viagem de forma mais descontraída, pois pela minha formação ficava muito preocupado com a rota, previsão de tempestades e situações adversas que pudessem acontecer e como nos resolveríamos. Apesar das pescarias e boas conversas com o Beto e Augusto, das leituras e escritas terem sido inesquecíveis, acho que poderia ter curtido mais a contemplação da natureza, o nascer e pôr do sol de forma mais descontraída. Na realidade fiz uma viagem muito técnica como meu próprio diário identifica.
Augusto (“Indiana Jones dos mares cearenses”) – Qual o maior aprendizado dessa viagem? E a experiência de compartilhá-la em um livro?
Foi ver que os sonhos são possíveis de se tornarem reais. E a maior travessia foi interna, estava saindo de um processo muito difícil de separação, perdido cerca de dez por cento do meu peso. Tomando antidepressivo e remédio para dormir. Parei os remédios durante o percurso e nunca mais precisei. Foi uma vitória nos dois sentidos.
Beto (“Audacioso velejador”) – Qual o maior aprendizado dessa viagem? E a experiência de compartilhá-la em um livro?
O maior aprendizado foi o respeito pelo Oceano, pela dimensão divina que foi ter a noção vivenciando uma viagem tão grandiosa. Tendo de alguma forma compartilhar isso com o livro, de como somos insignificantes diante da dimensão do Universo e como o Mar nos ensina isso a cada momento.
Miguel (“O Lobo do Mar”) – Qual o maior aprendizado dessa viagem? E a experiência de compartilhá-la em um livro?
Tudo na vida gera aprendizado e experiência e esta viagem gerou tantas que fica difícil falar em poucas palavras, mas vamos lá: a primeira é que não se deve deixar passar oportunidades. Sim, o convite partiu do Augusto e era uma coisa meia que desafiadora pelas próprias circunstâncias que se apresentaram, pois seria realizada em breve, num barco e comandante que não conhecíamos apesar das boas referências de ambos, e a decisão de aceitar era pegar ou largar. Aí veio o ímpeto da aventura, do destemor, do inusitado, do aprender, do querer mais, do viver com intensidade, do fazer a minha história de vida e ter o que contar, o de não viver na mesmice e acomodado. Assim, o maior aprendizado além de tudo que vivemos e passamos nestes trinta dias a bordo é o de aproveitar as oportunidades que a vida lhe oferece, pois elas podem não se repetir. Muitas coisas acontecem e passam desapercebidas, pois não são registradas, e com este pensamento, logo na nossa primeira reunião de planejamento, decidimos entre outras coisas, que escreveríamos um livro, pois tínhamos o potencial necessário e uma história que era muito interessante de ser contada. Olha, não sabíamos nem o que veria pela frente mais já decidimos que iríamos contar. O livro foi feito a três mãos, a três cabeças, três viagens (é, cada um de nós fez sua viagem) de forma que mais que registrar uma travessia realizada, conta muito mais, pois além de ser um registro atemporal serve de fonte de informações a navegadores no lado técnico, porém tem um viés de motivação, de instigar a curiosidade, de dar informações marinhas de forma motivadora e com embasamento ambiental e oceanográfico além de fazer o leitor viajar na viagem que passa a ser dele também.
Sobre os autores:
Miguel Sávio de Carvalho Braga, Beto Peixoto e Augusto César Bastos
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