As lagartixas não fazem democracia, mas há quem pense que a democracia seja um conjunto de lagartixas. É possível obter as mesmas respostas para perguntas diversas quando se conversa com lagartixas em cima do muro. A democracia não é um jogo de cartas previsíveis, e engana-se quem crê que ela se resume a diálogo e consenso.
Na democracia, não é possível combinar tudo, porque os interesses se organizam em uma escala de divergências e antagonismos. As pessoas fazem mais do que balançar a cabeça, sinalizando um “sim”.
Na democracia burguesa, orientada e dirigida pelas elites econômicas, a classe trabalhadora conquista apenas paliativos — alguns suspiros —, mas não dirige os caminhos decisórios do poder. Esse tipo de democracia está vinculado a uma falsa ideia de liberdade e à crença de que a mudança é individual: pura fake news.
A democracia não é gerida pela harmonia; não é uma sinfonia. Nos concertos, as orquestras ensaiam, dividem funções e combinam o ritmo. Na democracia, o ritmo não é combinado, mas sim um cabo de guerra marcado por gritos e zurradas.
A confusão é inevitavelmente democracia. A história demonstra que são desconhecidas conquistas e revoluções que tenham surgido do silêncio.
Nas ditaduras, o silêncio não foi uma opção; na democracia, o rebuliço é a engrenagem que impulsiona o avanço.
Enquanto escrevo, as lagartixas balançam a cabeça. Os idealistas, aqueles que acreditam que ideias transformam, mas desconsideram a realidade, formulam concepções de democracia que cabem muito bem na literatura, como A Utopia, de Thomas More, ou em contos de fadas que terminam com um “felizes para sempre”.
Não é possível falar em democracia quando as cartas enviadas aos reis são respondidas com silêncio. Mas nem tudo é silêncio, e a cordialidade muitas vezes é dispensada em defesa da dignidade.
Sobre o autor:

Alexandre Lucas
Alexandre Lucas é escrevedor, articulista e editor do Portal Vermelho no Ceará, pedagogo, artista/educador, militante do Coletivo Camaradas e a integrante da Comissão Cearense do Cultura Viva.