A Literatura faz o quê?

Semana passada, a professora e colunista do Blog Literário: Nordestinados a Ler, Shirley Pinheiro, com os dedos “movidos pelo ódio”, escreveu um texto intitulado “Literatura não faz revolução”? A ira, esse pecado capital tão comum nas histórias literárias, nasceu quando ela escutou de um marxista de “uns vinte e poucos anos nas costas”, que a “Literatura não faz revolução!”.

Shirley Pinheiro só não citou todos os literatos e teóricos marxistas (brasileiros, franceses e alemães) que enfatizam o poder revolucionário da literatura, porque além de levar um tempo infindável, ainda assim, não convenceria o tal revolucionário. E, no fim das contas, não se trata de convencer A ou B.

Além do mais, devemos lembrar que o ponto de vista do outro não é necessariamente certo. “Pode ter raízes no preconceito”, na desinformação, nas suas experiências, na presunção de que tudo compreende, na pequenez de sua imaginação, nos seus valores, ou na falta deles.

Se cada época tem suas enfermidades e particularidades, a nossa se caracteriza pelo individualismo exacerbado, narcisismo, relações líquidas e positividade tóxica. O esgotamento físico e mental do sujeito contemporâneo, alçado à condição de “empresário de si mesmo” se realiza na morte… da imaginação, da fantasia, da sensibilidade, da empatia e da leitura.

Lemos cada vez menos, atrofiamos cada vez mais a nossa capacidade de interpretar um texto.  Neste sentido, a professora Olga de Sá questiona: “Nesta época de tanta ciência e tecnologia, para que publicar textos de Literatura? Quem por eles se interessaria?” A exemplo de mim e de Shirley Pinheiro, tantas mais.

Como um homem prático, o estudante de História, suponho, pensa nas soluções e nas respostas imediatas para fazer uma revolução. Depredar o patrimônio público? Pegar em armas?  Sequestrar autoridades? Atear fogo em estátuas? Não faço a mínima ideia.   

O que eu sei é que concordo com Che Guevara, símbolo de uma geração argentina que era contra a exploração capitalista na América Latina e propunha reformas sociais, de que “A revolução se faz através do homem. Mas o homem tem que forjar, dia a dia, o espírito revolucionário”.

Sem leitura não se concebem sujeitos informados e participativos dentro do meio social no qual estão inseridos.

Sem literatura não se concebem sujeitos críticos, éticos e empáticos capazes sair do conforto de seu lar para lutar por uma causa que esteja além do seu umbigo.

A literatura tem uma função humanizadora capaz de integrar o leitor aos problemas sociais do seu tempo.

Para que a revolução aconteça nas ruas, primeiro ela precisa acontecer dentro das casas, das escolas, das universidades. Por isso, a importância da família e dos professores em abrir a mente dos jovens. Com um machado? Não. Incentivando-os a ler, a se informar, compartilhando valores como justiça, solidariedade e amor.

Um homem alienado acha que sozinho, ao estudar História, faz revolução.

Um homem alienado acha que sozinho, ao estudar História, será capaz de contribuir para que as ruas estejam tomadas de pessoas para lutar por uma sociedade equitativa.

Um homem alienado, estudante de História, certamente não leu A Rosa do Povo (1945), de Carlos Drummond de Andrade, considerado pela crítica especializada o melhor livro de poesia de cunho político depois de o Navio Negreiros (1880), de Castro Alves.

Um homem alienado, estudante de História, certamente não leu o Manifesto Regionalista, publicado em 1926 por Gilberto Freyre, que buscava valorizar a cultura e as tradições nordestinas, bem como compreender a relação entre o homem e o meio social.

Um homem alienado, estudante de História, certamente não leu a Aula, texto proferido Roland Barthes no Colégio de França em 1977, em que o teórico diz que linguagem é poder. Literatura é linguagem. Logo, literatura é poder. Não é à-toa, que ao longo dos séculos, as mulheres foram impedidas de frequentar os bancos escolares e acadêmicos sob pena de sofrerem algum “mal”. 

Um homem alienado, estudante de História, não tem consciência de que mesmo sem armas é possível revoltar-se (Se tivesse lido o poema “A flor e a náusea”…).

Um homem alienado, estudante de História, certamente não leu, mas se leu não entendeu o conceito explícito do chamamento: “Proletários de todos os países, univos!”.

Um homem alienado, no arroubo de seus vinte e poucos anos de idade, diz certas atrocidades, porque no auge de sua imaturidade se acha superior àqueles que são forjados pelo diálogo, pela escuta, pela leitura e pela literatura.

Um homem alienado, no arroubo de seus vinte e poucos anos de idade, estudante de História, que não lê literatura Shirley Pinheiro, é um tolo!

Sobre a autora:

Luciana Bessa Silva

Idealizadora do Blog Literário Nordestinados a Ler

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