Quando criança se encontrava enrolado nas histórias de ninja. Fazia suas armas de lata e cabos de vassoura. Imaginava escalando paredes e desaparecendo com bombas de fumaça. Se via derrotando com chutes e socos aqueles que atacavam a sua felicidade.
Ser ninja nutria a dimensão do poder e da autodefesa. Mas também queria ser bruxo, místico – ou qualquer outra palavra equivalente para as pessoas que lidam com coisas que não se explicam a partir da ciência. Buscava conhecer o poder das pirâmides, das rochas, dos chás, das orações e das simpatias. Na verdade, buscava fórmulas mágicas para transformar a vida, já que ela não é algo fácil de lidar.
A gente é sempre multiplicidade de desejos. Nunca conseguimos ser apenas um anseio. Vamos sendo muitos em um só corpo. Ser ninja e bruxo, talvez ainda seja uma vontade pulsante.
Dizem que os ateus rezam em momentos de medo. Quando o medo passa, a oração deixa de ser necessária.
Se a literatura tivesse o poder dos ninjas e dos bruxos, o mundo certamente poderia ser bem pior. Imagina o que a raiva poderia fazer com a realidade. Bastaria criar histórias como a do fim do mundo, do dilúvio. Mas cada poder é limitado – que alívio.
Se a cada dia pudéssemos ser um personagem diferente, precisaríamos de muita habilidade. Impossível. Mas deve acontecer algo parecido. Creio que os bruxos e os ninjas residem em algum canto dos nossos labirintos. Em algum momento, pelo menos, essa vontade se acorda.
Hoje é sexta-feira. Os ninjas e os bruxos estão guardados. Saíram para sambar. Amanhã é dia de ressaca – e talvez eles voltem. Talvez.
Sobre o autor:

Alexandre Lucas
Alexandre Lucas é escrevedor, articulista e editor do Portal Vermelho no Ceará, pedagogo, artista/educador, militante do Coletivo Camaradas e a integrante da Comissão Cearense do Cultura Viva.