Vazio preenchido de ecos do passado. A tarde transbordava ausências, grilos cantavam nos pensamentos. Seu corpo estendido no chão frio da sala dos livros, enquanto o reggae batia a dança das cobras. Lia sobre os tempos de chumbo e a rebeldia das palavras; foices contra balas, poemas fabricados como coquetéis molotovs nos aparelhos da clandestinidade. Sonhos montados sobre esperança, erguidos de braços e assobios.
A tarde escancarava o desejo das multidões, mas só as lembranças compareciam. Ali, na trincheira da sala dos livros, tentava desenterrar o texto. Na guerrilha, há momentos sem pares nem água – às vezes é preciso recuar sete estrelas e sete sóis, para nunca mais voltar.
À tarde, que já poderia ser noite, prosseguia. Lá fora, o filho desbravava a cidade em festa; bandeirolas coloridas dançavam com sorrisos. Dentro, o pai temperava o dia seguinte.
A sala de livros guarda mundos. Mastiga rapadura – doce e dura, seria previsível. Inventa de colocar pimenta e sal: arde, faz careta, saliva. Prepara suco de limão e bebe aos poucos – como quem não quer perder as lembranças. As palavras brotam do ontem, do hoje, do amanhã. Deixa cartas de flores sob portas sufocadas, espalha caixas de fósforos com poesia para incendiar corações frios.
Sobre o autor:

Alexandre Lucas
Alexandre Lucas é escrevedor, articulista e editor do Portal Vermelho no Ceará, pedagogo, artista/educador, militante do Coletivo Camaradas e a integrante da Comissão Cearense do Cultura Viva.