A força da mulher na obra Éramos Seis, de Maria José Dupré

No início do século XX, poucas mulheres tinham acesso à educação e ao espaço público, pois sendo consideradas seres inferiores estavam em casa servindo ao pai e, depois do casamento, ao marido.

Marginalizadas, inferiorizadas, vistas muitas vezes como aberrações, a história das mulheres é marcada pela exclusão, pelo silêncio e pela subalternidade. Ser do sexo feminino era sinônimo de indolência, passividade e obediência às normas sociais.

Logo, o cânone literário foi dominado majoritariamente por homens brancos e frutos de uma elite. Sem formação e informação a autoria feminina foi marcada pelo reducionismo.

Por isso, é necessário compreender a participação da mulher ao longo da história, seja na condição de criadora, ou como criatura, haja vista que ela era retratada como com um ser frágil, que precisava da proteção masculina para alcançar a completude e subsistência.

Como o lugar de mulher é onde ela quiser, na obra Éramos Seis (1943), de Maria José Dupré, o destaque é para a personagem Lola, mãe e dona de casa, cujo maior sonho é ter uma família unida. Não é à toa que a autora tenha dedicado à obra às donas de casas, restritas ao ambiente doméstico. Sabe-se que culturalmente o trabalho doméstico não é valorizado.

Marcada pela memória e pelo saudosismo, Lola é a responsável por contar a sua história, consequentemente, a da família Abílio de Lemos, composta por ela, o marido Júlio e seus quatro filhos: Carlos, Alfredo, Julinho e Isabel, em um período de vinte e oito anos, que compreende o ano de 1914 (Primeira Guerra Mundial) a 1942 (Segunda Guerra Mundial e, no Brasil, o Estado Novo).

Lola, matriarca da família, é trabalhadora, resiliente, acolhedora e sentimental. Saiu do interior (Itapetininga) casada e muda-se para a capital (São Paulo), no bairro de Bom Retiro. No entanto, realiza-se materialmente, quando se transfere para a casa da Avenida Angélica. Lá viveu dias de luta e dias de luto, à medida que a família vai se desmanchando: primeiro morre o marido e depois o filho primogênito (Carlos), Alfredo foge do Brasil em um navio cargueiro e alista-se na marinha norte-americana, Julinho casa-se e vai morar no Rio de Janeiro e Isabel vai viver com Felício, um homem desquitado e com um filho, e os laços com a família são cortados por um longo período.

Éramos Seis (1943) foi inicialmente publicada pela Companhia Editora Nacional e ganhadora do prêmio Raul Pompeia, em 1944, concedido pela Academia Brasileira de Letras (ABL). 

Dois anos após sua publicação, já em 1945, a obra foi adaptada como radionovela pela Rádio Tupi e levada para as telas de cinema pelos argentinos. Na TV, foram cinco versões: a primeira em 1958 pela Record e a última em 2019 pela Rede Globo.

Na década de 1973, a obra foi incluída na Série Vaga-Lume, ilustrada com sete imagens legendadas e permanentes, que vai da primeira à quadragésima segunda edição, projeto editorial da Série.

É verdade que a crítica especializada considerou essa obra “comum”, porque não retrata uma história de amor impossível e não levanta questionamentos existenciais, mas não levou em consideração que estamos diante de um texto poético, fluído, dinâmico e com personagens envolventes que lutam para ter o básico: uma casa e uma família.

Se a essência da literatura é envolver, maravilhar, instruir e fazer refletir, Éramos Seis é uma dessas obras que nos faz pensar na terceira idade, no papel da família, na força da mulher-mãe, que se dedica anos a fio aos filhos e termina na mais completa solidão, mas com um coração exalando amor e generosidade, sentimentos pouco cultivados em uma sociedade de relações líquidas.

Sobre a autora:

Luciana Bessa Silva

Idealizadora do Blog Literário Nordestinados a Ler

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