A artista multifacetada Elza Soares em sua música, “A Carne”, expôs o que sabemos, mas em tempos como o nosso, o óbvio precisa ser dito: “A carne mais fresca do mercado é a carne negra”. Trata-se de uma crítica contundente aos descalabros que a população negra sofreu/sofre em um país que insiste em negar que o racismo exista.
O mote usado por essa mulher de voz rouca, eleita na década de 90, pela Rádio BBC de Londres, como a cantora brasileira do milênio, foi semelhante ao usado pelo apresentador e jornalista Jô Soares para construir seu texto “O professor está sempre errado!”.
O autor de O Xangô de Baker Street (1995), livro que se transformou em filme no ano de 2001, vale-se de um tom irônico e crítico para dizer que “O material escolar mais barato que existe na praça é o professor!”. A explicação se fundamenta no projeto de imperfeição chamado raça humana, que reconhece o professor a partir de suas desvirtudes.
Ou seja, professor quando é jovem não ensina bem, porque é inexperiente, mas se não é jovem, está ultrapassado. Em uma sociedade etarista como a nossa, passou dos quarenta anos, pouco ou nada pode contribuir para a sociedade.
Se o professor fala alto com os estudantes, ele grita; mas se não fala alto, ninguém consegue escutá-lo. Caso alguém descubra o tom perfeito que o professor deveria usar em sala de aula com uns sessenta jovens, cujos hormônios fervem em seus corpos e que precisam ficar em média, cinco horas por dia entre quatro paredes, muitas vezes sem um ventilador, como é o caso de algumas escolas públicas, deveria patentear, ficar rico e difundir mundo afora essa descoberta. Admito: sou uma das profissionais que já está na fila para comprar o “tom de voz adequado do professor”.
O texto de Jô continua questionando os métodos utilizados pelo professor: Se a prova é extensa, o estudante não consegue terminá-la em tempo hábil; mas se é curta, não dá chance para que ele possa mostrar seus conhecimentos. Caso resolva escrever, o profissional não terá tempo para explicar seus escritos; contudo, se optar por argumentar, o caderno dos alunos não terá nada escrito. E o pior: se dá muita matéria, não se importa com os aprendentes; porém, se diminui, não consegue prepará-los para o mercado de trabalho.
Brincar com a turma para descontrair, nem pensar. Não brincar, só mostra que é um profissional ensimesmado e preocupado com o conteúdo. Se resolve adotar uma linguagem jovem, não tem um bom vocabulário. Agora, se tem um bom vocabulário e resolve usá-lo, não passa de um pedante. Em resumo, Jô conclui: “o professor está sempre errado…” Mas, uma coisa é certa: “Mas se você conseguiu ler até aqui, agradeça a ele!!!”.
Confesso: sou uma professora que admira e agradece o trabalho desses profissionais, que gostam tanto de gente, que resolveram compartilhar seus conhecimentos com outras ‘gentes’, de todas as idades, de todos os credos e de todas as cores e todos os amores.
Infelizmente, nem tudo são flores. Na verdade, há bem mais espinhos na infinda sequência de etapas que um docente percorre ao longo da carreira. O que comemorar no Dia do Professor, quando não se tem apoio psicológico, quando não se tem condições adequadas para desempenhar suas funções, quando se tem uma rotina massacrante dentro e fora de sala de aula, não se tem salários e planos de cargo de carreira atraentes, afinal, professor “tem que trabalhar por amor”? Estou aqui na dúvida: E os outros profissionais? Amor paga os boletos no final do mês?
Enquanto o professor for tratado como o material mais barato da praça, estaremos contribuindo por uma Educação “Xoxa, capenga, manca, anêmica, frágil e inconsistente”, ocupando um lugar de vergonha entre os países avaliados pelo Programa Internacional de Avaliação de Alunos (PISA):”O Brasil ocupa o 53º lugar em educação, entre 65 países avaliados”.
Caso queiram mudar a Educação brasileira, fica a dica: não permita que o professor seja “o material mais barato da praça”. Valorize o professor!
Sobre a autora:
Luciana Bessa Silva
Idealizadora do Blog Literário Nordestinados a Ler