Esperança Garcia, negra escravizada e primeira advogada do Piauí

O período da escravidão, no Brasil, foi marcado por mortes, torturas, violências e injustiças. A abolição da escravatura  aconteceu em 13 de maio de 1888, por meio da Lei Áurea, contudo, nosso país foi o último das Américas a abolir a escravidão. Uma mancha que não poderemos apagar dos livros de História. 

 Ser negro neste país era sinônimo (e ainda é) de não ter direitos, desigualdades, exclusão, preconceito e opressão.  É um desafio constante a luta contra o racismo e sua superação de forma estrutural e institucional na sociedade.

Uma das vítimas da escravidão foi a Esperança Garcia, mulher negra, corajosa e que tem sua história marcada por lutas, sofrimentos e conquistas. Aos 9 anos, Garcia foi expulsa do Piauí para ser escrava na casa do capitão Antônio Vieira de Couto. Então, em 6 de setembro de 1977, Esperança escreveu uma carta ao governador da Capitania do Maranhão, denunciando os maus tratos que ela sofria, assim como seus filhos e suas companheiras e pediu para retornar à Fazenda Algodões e para ter sua filha batizada:

Eu sou uma escrava de V.S.

da administração do Cap.

Antônio Vieira de Couto, casada.

desde que o Cap. Antônio lá foi administrar, que me tirou da Fazenda dos algodoes, onde vivia com meu marido, para ser cozinheira da sua casa, onde nela passo muito mal.

…ponha aos olhos em mim ordinando digo mandar o Procurador

que mande para a Fazenda aonde ele me tirou para eu viver com meu marido e Batizar minha Filha  de V.Sa. sua escrava

Esperança Garcia.

(A Carta da Esperança Garcia, 1977) 

Pela carta, é possível ver que Esperança era uma mulher simples, consciente de si e de suas responsabilidades, por isso não se calava diante das atrocidades vividas. Era uma mãe que queria apenas salvar sua filha dos castigos escravos e batizá-la no lugar onde ela (Esperança) havia nascido. 

A carta acima é um divisor de águas na vida dessa mulher aguerrida. O texto foi considerado a primeira petição escrita por uma mulher na história piauiense. Esperança foi considerada uma percursora da advocacia no estado do Piauí pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB/PI). A missiva é também um documento importante nas origens da literatura afro-brasileira, considerando o desdobramento dos acontecimentos para que ela se originasse, inclusive o dia 6 de setembro, data em que a carta foi enviada para o Governador da província, ganhando destaque e sendo comemorado o Dia Estadual da Consciência Negra.

Esperança Garcia, assim como todas as outras grandes escritoras, deixou seu brilho no mundo e por isso em homenagem a ela, foi criado o Instituto Esperança Garcia, que é um projeto de educação dos sonhos possíveis, inspirado pela sua memória, por ser mulher negra, mãe guerreira que não aceitou a escravidão e que teve ousadia de escrever para as autoridades, pois precisava de uma solução para sair da condição de cativa em que vivia. Esperança deixa de ser escrava e alcança lugar de honra na advocacia, sendo devidamente valorizada e tratada como merece. Garcia venceu na sua jornada de luta por melhores condições de vida e liberdade e se tornou exemplo de mulher negra dentro da literatura e da história do Brasil, uma história que precisa ser revisitada e questionada por cada um de nós.  

Portanto é por conhecer histórias como a de Esperança Garcia que refletimos o quanto é importante não se calar diante das mazelas de nossa sociedade. É necessário falar, sobretudo escrever sobre a valorização dos nossos direitos como cidadão, não aceitação de maus tratos, respeito a si mesmo etc. A palavra foi o recurso usado por Esperança Garcia para transformar sua vida e a de outras mulheres. Escrever é um ato revolucionário. 

Fonte: 

Esperança Garcia. In: WIKIPÉDIA: the free encyclopedia. [San Francisco, CA: Wikimedia Foundation, 2010]. Disponível em: https://pt.wikipedia.org/wiki/Esperan%C3%A7a_Garcia. Acesso em: 1 dez. 2021.

GALF, Renata. Quem foi Esperança Garcia, negra escravizada reconhecida como 1ª advogada do Piauí. Folha de S. Paulo, São Paulo, 18 nov. 2020. Disponível em: https://www1.folha.uol.com.br/poder/2020/11/quem-foi-esperanca-garcia-negra-escravizada-reconhecida-como-1a-advogada-do-piaui.shtml.  Acesso em: 1 dez. 2021.

Sobre a autora:

Letícia Isabelle Alexandre Filgueira

Graduanda em Letras pela Universidade Estadual do Ceará/ Faculdade de Educação Ciências e Letras – UECE/ FECLI

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