“Se alguém perguntar por mim / Diz que fui por aí...”. E se foi no dia 7 de março do ano de 1989. Estou falando de Nara Leão, cantora, compositora e instrumentista brasileira, nascida no dia 19 de janeiro de 1942, em Vitória, Espírito Santo, conhecida como a “musa da bossa nova” – apelido que lhe foi dado pelo compositor carioca Sérgio Porto.
A Bossa Nova nada mais foi do que um movimento da música popular brasileira nascido na década de 1950 que marcava a renovação do samba. Vinícius de Moraes, Roberto Menescal, Carlos Lyra, Dorival Caymmi, Edu Lobo, Baden Powell, Nelson Motta, Wilson Simonal, Ronaldo Bôscoli e, claro, Nara Leão foram figuras essenciais para consolidar um estilo de música caracterizado por ser intimista, coloquial e cotidiano.
Bossa Nova é, para mim, sinônimo de poesia. Para provar observem alguns desses versos:
“Eu sei que vou te amar
Por toda a minha vida eu vou te amar…” (Vinícius de Moraes)
“Todo mundo me pergunta, porque ando triste assim
Ninguém sabe o que é que eu sinto, com você longe de mim…” (Tom Jobim)
Poesia e Música nos séculos XI e XII eram uma coisa só. Duas artes da comunicação, que mantêm uma relação íntima e complementar, embora não haja equivalência musical para o discurso verbal. Na Idade Média, Trovador, Menestrel e Poeta eram sinônimos e a poesia era feita para ser cantada.
É importante frisar que, hoje, o músico não se serve do poema, mas sim da interpretação que faz dele após a sua leitura. É um trabalho de releitura e apropriação, por isso quando escutamos uma canção não é o poeta que fala, mas o músico. Somente na Idade Moderna, houve a cisão entre Poesia e Música. Embora separadas, o poema permaneceu preservando traços musicais. Música e Poesia integram a vida humana, reavivam lembranças e despertam sensações variadas, como prazer, alegria, dor, tristeza e paz. Essas duas artes têm grande efeito nos sentimentos e desejos humanos.
Enquanto a música brasileira ganhava outros ares, Nara Leão, com apenas 15 anos de idade promovia reuniões no apartamento de seus pais (Jairo e Altina) para discutir e vivenciar tais mudanças musicais.
Sua estreia enquanto intérprete ocorreu no ano de 1963, ao lado de Vinícius de Moraes e Carlos Lira, no show intitulado “Pobre Menina Rica”. Contudo, sua consagração aconteceu no ano seguinte no espetáculo “Opinião” – uma contundente crítica ao regime militar – ao lado de Zé Keti e João do Vale.
De “Musa da Bossa Nova” Nara Leão tornou-se “Cantora de protesto” e persona non grata, motivo pelo qual a ditadura invocou contra ela a Lei de Segurança Nacional. Artistas de todas as áreas se mobilizaram para defendê-la e enviaram ao presidente Castelo Branco um abaixo-assinado com 150 assinaturas. Até mesmo o discreto poeta gauche, Carlos Drummond de Andrade, escreveu um poema-apelo solicitando que Nara Leão não fosse presa:
“Meu honrado marechal
dirigente da nação,
venho fazer-lhe um apelo:
não prenda Nara Leão (…)”
O manifesto deu resultado, mas Nara Leão não mudou de “Opinião” e a ditadura continuou a persegui-la. Mulher inconformada com os rótulos que recebia, com a opressão que o país vivia, cantou livremente a música e a poesia de uma geração que não aceitava as privações de seus direitos.
Sobre a autora:
Luciana Bessa Silva
Idealizadora do Blog Literário Nordestinados a Ler