Câmara Cascudo, o legado do homem que sabia de tudo

“Nasci na rua das Virgens e o padre João Maria batizou-me no Bom Jesus das Dores, Campina da Ribeira, capela sem torre, mas o sino tocava as Trindades ao anoitecer. […] Queria saber a história das cousas do campo e da cidade. Convivência dos humildes, sábios, analfabetos, sabedores dos segredos do Mar das Estrelas, dos morros silenciosos. Assombrações. Mistérios. Jamais abandonei o caminho que leva ao encantamento do passado. Pesquisas. Indagações. Confidências que hoje não têm preço. Percepção medular da contemporaneidade. […] Filho único de chefe político, ninguém acreditava no meu desinteresse eleitoral. Impossível para mim dividir conterrâneos em cores, gestos de dedos, quando a terra é uma unidade com sua gente. […] Andei e li o possível no espaço e no tempo. Lembro conversas com os velhos que sabiam iluminar a saudade. Não há recanto sem evocar-me um episódio, um acontecimento, o perfume duma velhice. Tudo tem uma história digna de ressurreição e de uma simpatia. Velhas árvores e velhos nomes, imortais na memória”.

Câmara Cascudo, em “A Província”, edição comemorativa aos seus setenta anos de idade e cinquenta de atividade literária.


Como definir o “grande legado” de um intelectual? Seria a partir da quantidade/qualidade da obra deixada por ele, ou da abrangência de sua área de atuação, ou mesmo de seus feitos em sociedade? Seja como for, quando o assunto é o potiguar Câmara Cascudo, pouco importa. Isso porque ele, o autor de mais de 150 obras, foi historiador, sociólogo, musicólogo, antropólogo, etnógrafo, folclorista, cronista, poeta, advogado, professor e jornalista, além de ser dono de um grande estudo acerca da cultura brasileira.

Nascido em 30 de dezembro de 1898, em Natal, capital do Rio Grande do Norte, aos 19 anos, Câmara Cascudo começou a trabalhar no jornal A Imprensa, que pertencia ao seu pai. Aos 22, escreveu a introdução e as notas de Versos Reunidos, antologia poética de Lourival Açucena. Dois anos depois, em 1921, Cascudo lançou seu próprio livro, o primeiro, Alma Patrícia, um estudo crítico e bibliográfico de dezoito poetas nascidos e erradicados no Rio Grande do Norte.

Formado em Direito pela Faculdade de Direito da Universidade Federal do Pernambuco, como historiador, Câmara Cascudo aprofundou-se em pesquisas sobre o homem e o Brasil, das quais registrou referências da sabedoria popular e elementos da cultura brasileira. A partir dessas pesquisas, lançou, em 1954, lançou seu trabalho mais importante como folclorista, Dicionário do Folclore Brasileiro, a obra reconhecida no mundo inteiro que mostra que o folclore não é apenas um conjunto de expressões culturais estáticas, mas que estão em constante movimento, bem como seu povo e da mesma forma devem-se manter os estudos que os cerceiam. 

Câmara Cascudo era conhecido como o homem que sabia tudo. Dono de um bom humor e muito querido por onde passava, era receptor de muitas histórias e informações. Foi reconhecido e aclamado pela crítica literária e pelo público leitor, além de vencedor do Prêmio Machado de Assis da Academia Brasileira de Letras, pelo conjunto de sua obra, que abrange as áreas de etnografia, antropologia, literatura, religião, geografia, folclore, dentre muitas outras. Câmara Cascudo nós deixou um grande legado com sua obra, suas pesquisas e seu valor na sociedade.

Sobre a autora:

Shirley Pinheiro

Graduanda em Letras pela Universidade Regional do Cariri.

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