Todos os meus humores, de Dia Nobre

Dia Nobre é uma escritora e professora universitária, nascida em Juazeiro do Norte, mas vive e trabalha em Pernambuco. Doutora em História, publicou dois livros na área. Seu primeiro livro literário foi publicado ano passado, sob o título Todos os meus humores (Penalux) e seu segundo livro, No útero não existe gravidade, foi lançado em maio de 2021 pela mesma casa editorial.

Todos os meus humores é uma obra de escrita híbrida, dividida em quatro partes: sanguínea, fleumática, colérica e melancólica. Cada um desses humores corresponde a um conjunto de textos, às vezes em verso, às vezes em prosa. A escrita poética de Dia Nobre parte de um lugar íntimo, apresentado mil facetas de uma mulher que transita pelas dores e delícias de carregar e existir dentro de um corpo feminino.

de todos os fogos
o que mais me queima
é aquele que brota
da minha buceta
quando tua boca faísca-chama.

Quando a voz suspirosa enuncia o fogo que consome a pele, a paixão faz a carne tremer. Essa “faísca-chama” é uma forma de amor fora da órbita, essa órbita arbitrária guiada pela heteronormatividade. O amor e a cumplicidade entre mulheres é a grande tônica dos versos de Dia Nobre. Dos cadernos de adolescente até a vida adulta, a memória da poeta subscreve o espaço e o tempo e desenha o porvir.

rendo-me
porque sou capaz.
– eu me sustento nos meus defeitos..
.

As questões de saúde mental e emocional reaparecem o tempo todo desde o título. Na inconstância do agora, na aspereza da convivência e na solidão da menina-mulher que tenta o tempo inteiro fazer as pazes com um passado que insiste em não passar. Caminhamos na corda bamba, entre a invisibilidade do acontecimento, do silêncio que grita dentro do pensamento e do refazer desses passos. Esta mulher resiste, não se prosta assente às imposições do mundo, mas ergue sua voz e nela forja seu escudo.

mulher
olha para o futuro
e faz dele seu presente

nessa linha atemporal…

A voz lírica e rebelde que nos envolve com o seu canto desde o primeiro contato, nos propõe um pacto, um convite para mergulharmos fundo na vida de uma mulher comum e por essa razão – extraordinária. Dividimos segredos e corremos o mundo, embalados pelos ventos poderosos dessa força feminina que também se deixa sucumbir pela solidão e pela dor para em seguida se erguer imensa em prazer, desejo, sonho e (r)existência(s).

Adriane Figueira

Adriane Figueira é uma escritora e pesquisadora paraense que vive no Rio de Janeiro. Graduada em Letras pela UFPA, é mestra e doutoranda em Estudos Comparados de Literaturas de Língua Portuguesa pela USP. Revisa, lê, escreve e pesquisa sobre Literaturas. Idealizadora e professora no Atelier Epifanias, projeto que oferece cursos de escrita criativa. Publicou textos em três antologias: 70x Caio (Patuá – 2019), Ruínas (Patuá – 2020) e Trama das Águas (Monomito – 2021). Autora de Revoada do Dragão (Patuá – 2021).

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