Escritora, contista, jornalista, tradutora e artista plástica ítalo-brasileira, publicou mais de setenta obras para crianças e adultos, Marina Colasanti é uma importante escritora da literatura brasileira. Suas obras refletem com delicadeza sobre assuntos ásperos, entre eles, a opressão da mulher na sociedade. A escrita de Colasanti instiga o leitor a perceber a beleza de tudo que estar ao seu redor que, mas por conta da rotina do dia a dia, acaba por não enxergar os pequenos e marcantes detalhes que lhes perpassam, como está presente na obra: Eu sei, mas não devia. Marina questiona-se sobre os costumes e hábitos desenvolvidos pelo homem durante a sua existência:
Eu sei que a gente se acostuma. Mas não devia. A gente se acostuma a morar em apartamentos de fundos e a não ter outra vista que não as janelas ao redor. E, porque não tem vista, logo se acostuma a não olhar para fora. E, porque não olha para fora, logo se acostuma a não abrir de todo as cortinas. E, porque não abre as cortinas, logo se acostuma a acender mais cedo a luz. E, à medida que se acostuma, esquece o sol, esquece o ar, esquece a amplidão (COLASANTI, 1996, p. 9).
No trecho a acima a autora nos faz refletir sobre como nos acostumamos com uma vida artificial, monótona, que nos impede de sentir o cheiro da natureza, aquele cheiro que nos dar saúde e fôlego de vida, e que alivia o estresse. Também é possível identificar nas palavras de Colasanti, que na medida em que nos aproximamos do mundo dentro de quatro paredes nos distanciamos no mundo lá fora que é real, onde existem pessoas como nós, que precisam de nossa companhia, nossas palavras, nossa amizade, afinal somos seres dependentes uns dos outros e que por isso é importante dar valor ao que realmente importa.
Marina Colasanti nascida em 1937, na cidade de Asmara, capital da Eritréia, na África, também fala sobre a mulher não se submeter ao machismo imposto pela sociedade, afirmando que na medida em que se vive dentro de uma rotina, todos os acontecimentos dentro dela, tais como as injustiças e anormalidades, são naturalizados.
Colasanti também tem uma vasta obra (mais de vinte títulos) dedicada ao público infantil, como por exemplo, Minha Ilha Maravilha, A Árvore Generosa, Ofélia, a Ovelha, Ana Z, Aonde vai Você? O Nome da Manhã, Penélope manda Lembranças, dentre outras, pois ela acredita que a narrativa é uma necessidade humana; e a literatura, formativa. Talvez por isso, desde pequena tenha convivido com os livros.
Enquanto cronista, escreveu obras tais como Eu sei, Mas Não Devia (1995), A Casa das Palavras (2000), Esse Amor de Todos Nós (2000). Os Últimos Lírios no Estojo de Seda (2006), Crônicas Para Jovens (2012), Melhores Crônicas (2016) e Eu Sozinha (2018). Marina Colasanti é uma das escritoras brasileiras mais premiadas no Brasil e no mundo. Suas obras alcançam leitores de diversas faixas etárias.
A autora de Contos de amor rasgado (2010) aborda, ainda, temas sobre a natureza, relatando o sofrimento ambiental da poluição no ar, haja vista que o ser humano é ambicioso. A autora também fala sobre o vício ao trabalho duro e a valorização do descanso em fim de semana, pois sempre estamos cansados, veremos isso no trecho abaixo, ainda da obra, Eu sei, mas não devia:
…Se o trabalho está duro, a gente se consola pensando no fim de semana. E se no fim de semana não há muito o que fazer a gente vai dormir cedo e ainda fica satisfeito porque tem sempre sono atrasado. (COLASANTI, 1996, p. 1)
Portanto, a escritora nos convida a refletir sobre a sociedade do consumo, sobre o poder masculino que impera sobre as mulheres impondo-lhe suas vontades e pretensões, como diz em um trecho de uma de suas obras, intitulada, Mulher daqui para Frente:
Na ginástica, no trabalho, nos jantares, pingada com naturalidade no meio das conversas, ouço com frequência esta frase: “Meu marido não deixa.
Que significa ela? Que o marido tem o poder de veto. Que tem o direito de estabelecer tudo aquilo que a mulher pode ou não fazer. E que este direito é tacitamente reconhecido pelos dois elementos do casal. (COLASANTI, 1990, p. 196)
Marina Colasanti, contempla uma “nova mulher” tematizando a questão da independência para o sexo feminino que foi educado para ser esposa e mãe. A escritora questiona a valorização do casamento pela sociedade, tornando privilegiadas as mulheres que se casam e desprestigiadas aquelas que não colocam o matrimônio em prioridade. Colasanti também nos faz meditar sobre como lidamos com as injustiças presentes no mundo e sobre a velocidade do tempo em que vivemos que nos obriga a avançar sem apreciar o que está ao nosso redor.
Portanto, percebe-se a importância de Colasanti para a literatura brasileira e mundial, pois ela nos faz ver a vida como ela é e estar, através da arte do escrever, do pensar, do questionar-se por tudo, desenvolver um senso crítico, deixar de lado os velhos costumes que não valorizam nossa existência, atualizar nossas ideias sobre o valor da vida, o valor da mulher, que atualmente vale por dois, três ou quatro homens. Fica aqui o nosso agradecimento a essa grande artista que fez da literatura uma arte de expressão e valorização.
Fonte:
COLASANTI, Marina. Mulher daqui pra frente. São Paulo: Círculo do Livro, 1990. 190 p.
COLASANTI, Marina. Eu sei, mas não devia. Rio de Janeiro: Rocco, 1996. 192 p.
FRAZÃO, Dilva. Biografia de Marina Colasanti. Ebiografia, 14 nov. 2017. Disponível em: https://www.ebiografia.com/marina_colasanti/. Acesso em: 1 dez. 2021.
Sobre a autora:
Letícia Isabelle Alexandre Filgueira
Graduanda em Letras pela Universidade Estadual do Ceará/ Faculdade de Educação Ciências e Letras – UECE/ FECLI